Se há ideia que vai tomando forma e ficando cada vez mais clara é esta: a literatura infantil não se destina apenas a crianças. Como refere João Manuel Ribeiro, a literatura infantil é a mais democrática de todas, pois pode ser lida por toda a gente. Na verdade, nunca a literatura infantil se destinou tanto aos ADULTOS.
Os sete livros mais referidos em resposta à questão "Que livro recomendaria a um adulto?" |
Chegados ao final de mais um ano letivo, é prática comum, com os alunos da licenciatura em Educação Básica, fazermos um balanço: O que levam desta Unidade Curricular? Que livro recomendariam a um adulto? são duas das questões que norteiam esta "tertúlia" de encerramento.
E foi num destes momentos que uma aluna referiu: "levo a consciência de que se sabe muito pouco de literatura infantil, principalmente em contexto de família".
Esta constatação tem lugar depois de um ano de contacto semanal com a produção literária para a infância, de análise, de reflexão, de partilha de ideias, emoções e descobertas, de experimentação do poder da literatura (infantil). Depois de um ano "transformador", como mencionou outra aluna, acrescentando "tenho pena de não ter conhecido estes livros mais cedo".
Dois dos textos mais referidos (Onde está a felicidade? O Amor o que é?) |
Ora, que livros são esses que tanto mexem connosco? Trazemos aqui os sete títulos mais referidos em resposta à questão "Que livro recomendaria a um adulto?" (primeira imagem).
Apenas uma breve análise aos títulos, permite-nos concluir que a Felicidade é algo que todos buscamos (está presente explicitamente em dois títulos), que o Amor, nas suas mais diversas formas, é o verdadeiro motor da vida, que os laços de Afeto são o nosso aconchego, que a Família é um porto seguro, e que o Humor é um ingrediente imprescindível para uma vida feliz!
São muitos os alunos que referem o texto Onde está a felicidade?, de Álvaro Magalhães, como "história que todos os adultos deviam conhecer", um conto que integra a coletânea O Senhor do seu Nariz, e do qual já falamos AQUI, quando inauguramos a nossa rubrica Livros para uma Pedagogia da Felicidade. Este é, sem dúvida, um conto que não deixa ninguém indiferente, pois todos nos conseguimos rever na história do Sr. Pascoal. Do mesmo modo que facilmente nos identificamos com as diferentes personagens que povoam o Vendedor de Felicidade, um livro de David Cali e Marco Somá, que apresentamos AQUI, numa seleção de obras de 2021 sobre esta temática.
Pormenores do miolo de O amor o que é? |
O amor o que é?, de José Jorge Letria e Catarina França, é também das obras mais aconselhadas a adultos, pelo facto de nos mostrar o AMOR nas suas diferentes vertentes e manifestações, sendo um livro que nos faz "olhar para coisas a que habitualmente não prestamos atenção, mas que fazem muita diferença na nossa vida", como referiu uma aluna. Na imagem acima, podemos conhecer um bocadinho desta maravilhosa poética do amor.
Capa e pormenor do miolo de A Árvore Generosa |
O incontornável clássico de Shell Silverstein, A Árvore Generosa, é, ano após ano, um dos títulos que se repete nesta lista de "livros recomendados a adultos". Efetivamente, esta obra acompanha-nos desde o início da nossa caminhada nesta missão de promoção da leitura em família, tendo integrado o corpus do projeto Lê para mim que depois eu conto...2, e o Programa de Educação Literária na Família, ELF2 (Uma partilha entre mil-folhas).
Num momento em que proliferam edições de "emocionários" (a este propósito aconselhamos a leitura deste texto de Ana Garralón), A Árvore Generosa constitui o exemplo perfeito para apresentar a Literatura como o melhor "laboratório de emoções", um livro que nos "revolve as entranhas", pelo facto de não deixar ninguém indiferente.
Trata-se de uma obra de múltiplas leituras, geradora de questões que passam, por exemplo, pela nossa relação connosco próprios, com o Outro e com o Planeta, pela busca do nosso lugar no mundo, pela impermanência, pela fugacidade da vida (e o que fazemos com ela). É (também) um livro sobre partidas e regressos, sobre silêncios e ruídos, enfim... sobre a VIDA no seu todo. É, sem dúvida, um livro de "leitura obrigatória" para adultos.
Pormenores do miolo de A Árvore Generosa |
Livros que abordam as representações da família, nomeadamente os que versam sobre a relação avós-netos, encontram-se, igualmente, entre as recomendações destes estudantes. A Manta do José, de Miguel Gouveia e Raquel Catalina e O Rosto da Avó, de Simona Ciraolo, obras de que falamos AQUI, foram os títulos mais recomendados.
A Manta do José, não apenas pela estreita relação entre um avô e o seu neto, mas também pela relação que estabelecemos com "as coisas", o valor emocional dos objetos, a sua ressignificação, enfim, esta obra encerra uma subliminar mensagem atual e urgente, que se destina a todos nós, que vivemos num mundo consumista, marcado pela moda do "descartável".
O Rosto da Avó é um hino à memória, um original convite para conhecer a história dos nossos avós (a quem, muitas vezes, não "atribuímos" uma infância e uma juventude). É uma obra surpreendente, marcada também por um interessante diálogo entre texto e ilustração.
O Nabo Gigante: capa. |
O Nabo Gigante, de Alexis Tolstoi e Niam Sharkey, integra a lista de recomendações sobretudo pelos fatores envolvimento e humor. Esta obra foi apresentada a estes estudantes como exemplo de narrativa de estrutura cumulativa, e das potencialidades de que este tipo de texto se reveste, por exemplo, na interação com o "público." Este género de narrativa gera, efetivamente, um grande envolvimento do(s) leitor(es) ou ouvinte(s), resultando em momentos muito agradáveis e bem dispostos, prova de que "ninguém resiste a uma boa história (bem contada)". Estes alunos recordarão, certamente, a aula em que toda a turma deu consigo a arrancar nabos da sala de aula:)
Pelo muito que há a dizer em relação às narrativas de estrutura cumulativa, é um assunto a que regressaremos numa próxima vez.
Pormenor do miolo de O Nabo Gigante |
Na verdade, concordamos com a aluna que disse sabermos muito puco sobre literatura infantil. E é, efetivamente, pelo facto de ao longo da nossa prática de mediação, virmos constatando que a falta de hábitos de leitura, quer em família, quer noutros contextos, se deve principalmente ao desconhecimento de bons livros de literatura infantil, que assumimos como missão a disseminação desse conhecimento, tornando-o acessível a todos. [LMB]
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