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sexta-feira, 23 de abril de 2021

Primavera de Livros

Entre duas efemérides que nos são tão caras, o Dia da Terra, que comemoramos ontem, e o Dia do Livro, que comemoramos hoje, estas duas mãos cheias de livros são o nosso modo de prestar uma singela homenagem a estas duas Grandes Casas Comuns.


Selecionamos um conjunto de títulos que têm por base a temática das estações do ano.

São obras que nos convidam a (re)descobrir a essência, a abrandar, a aprender que tudo tem o seu ritmo e o seu tempo. Enquanto parte do mesmo cosmos, nós também somos seres de ciclos e de ritmos. Ritmos esses que parecem estar um pouco esquecidos, na verdade… 

Portanto, regressar às origens, através da literatura, poderá constituir um possível (e poderoso) meio de reflexão sobre o nosso lugar nesta Casa que é de Todos. 

Na imagem acima vemos quatro obras que fazem referência explícita, visível no título, às estações do ano. Curioso é o facto de começarem em diferentes estações, reforçando a ideia de ciclo e de uma visão circular do Universo

As Estações é uma edição da kalandraka datada de 2009, uma narrativa exclusivamente visual, sem texto, da autoria de Iela Mari (que foi originalmente publicado com o título A Árvore – pela editora Sá da Costa Infantil em 1973).

Esta narrativa começa no inverno, terminando na mesma estação, apresentando uma visão cíclica do tempo e da natureza. Apercebemo-nos das transformações na paisagem, ao longo das quatro estações, através da vida que acontece na árvore e em torno da árvore – debaixo da terra, à superfície, nos seus ramos…

Uma das duplas páginas dedicadas à estação da primavera na narrativa visual As Estações de Iela Mari

A Primavera é o Tempo a Crescer integra uma deliciosa coleção de quatro volumes, dedicada às quatro estações do ano, editada pela Sá da Costa Infantil, da autoria de Maria Isabel César Anjo e Maria Keil. Constitui um claro convite não só a redescobrir a natureza que se renova, mas também a estender o olhar sobre o Outro, como podemos ver, por exemplo, neste excerto 

“A primavera é o tempo bom dos meninos das barracas que tiveram muito frio no inverno”.

(Falamos de outras obras desta coleção AQUI, onde podem ser vistas as capas dos quatro pequenos volumes).

Capa e pormenor do miolo do livro de Maria Isabel César Anjo e Maria Keil.
 Em cima, à direita, excerto do texto A Floresta de Sophia de Mello Breyner, correspondente ao "passeio de Isabel pela  primavera".

A obra, cujo miolo apresentamos abaixo, é também da kalandraka, e tem como mote a peça musical de Vivaldi, 
As quatro estações. É da autoria de José Antonio Abad Varela e Emílio Urberuaga, e conta com a interpretação musical de Sara chang. Trata-se de um interessante diálogo entre a literatura e a música, do qual já falamos AQUIAQUI e AQUI.
Pelo olhar de um pequeno esquilo vermelho, percorremos, ao som de Vivaldi (pois são apresentadas sugestões dos andamentos que devem acompanhar a narrativa), as quatro estações, com algumas das suas mais emblemáticas características e acontecimentos que habitualmente lhes correspondem, como o acordar do urso na primavera, o calor abrasador e as sestas do verão, as vindimas e a caça no outono e o frio do rigoroso inverno. 
Nesta obra, dicotomias como nascimento e morte, alegria e tristeza… tornam naturais a sua presença ao longo da vida de cada ser, reforçando a questão dos ciclos e ritmos próprios da vida. A narrativa começa na primavera e termina no inverno, com esta sugestiva conclusão:

 “Foi então que começou a soprar o vento, acompanhado de água e neve que confirmava de novo a presença de um longo e frio inverno. Mas todos sabiam que a primavera acabaria sempre por voltar.”

Pormenor do miolo de As Quatro Estações (as duas primeiras duplas páginas - dedicadas à primavera).

Poemas para as quatro estações é uma coletânea de poesia da autoria de Manuela Leitão e Catarina Correia Marques, editada pela Máquina de Voar, em 2017. Trata-se de um livro muito bonito, com poemas para todas as estações e para todos os gostos. Já por cá passou, tendo dado corpo às Andorinhas, mensageiras de esperança, e tendo também integrado as Representações do verão na literatura infantojuvenil.

Aqui convivem animais, árvores, flores, frutos (muitos frutos!), mas também cá chegam outras vozes, como a de Sophia, por exemplo, no poema a menina de Sophia, e até alguns textos em jeito de receita, como “Edital para a hibernação”, “Receita para esperar o inverno”, ou ainda “Como fazer o melhor Castelo de Areia”. Escolhemos para partilhar, nesta primavera de livros, “Cerejas”, um poema da primavera: 

“Quando ela come cerejas, 

daquelas gordas, vermelhas. 

Põe sempre quatro ou cinco, 

como se fosse um brinco, 

a enfeitar as orelhas! 

(Eu sei, eu sei… A minha mãe às vezes parece uma criança!)”

Dois poemas da primavera, da obra Poemas para as quatro estações

Num registo diferente, O Livro dos Quintais, de Isabel Minhós Martins e Bernardo Carvalho, editado pela Planeta Tangerina em 2010, é uma viagem pelos 12 meses do ano, que tem como pano de fundo oito quintais, onde moram oito famílias diferentes, que o leitor acompanha nos seus mais distintos afazeres, ao ritmo das cores e da transformação da paisagem, ao mesmo tempo que tentamos localizar o "Gatuno" (um dos gatos que integrou a nossa seleção Aqui há gatos (literários) que miam em português).

Pormenor do miolo de O Livro dos Quintais: dupla página correspondente ao mês de março e à chegada da primavera.

Em língua inglesa, este livro pop-up intitulado Seasons é um autêntico hino à beleza de cada estação, recordando-nos que as estações continuam, efetivamente, a ser quatro, e não apenas duas, como por vezes, por descuido do olhar, somos tentados a acreditar...

Do pop-up Seasons, páginas dedicadas à primavera.

Neste segundo grupo de livros, cujas capas podemos ver na imagem abaixo, as estações do ano, a passagem do tempo e a visão de um universo circular são apresentadas a partir do ciclo de vida das sementes. 


Em Uma pequena Semente, um belíssimo livro-acordeão da autoria de Mar Benegas e Neus Caamaño, um trabalho de outubro 2020, da editora Akiara, acompanhamos, de um lado, a vida da semente enquanto semente (no interior da terra) e do outro, a sua vida, a partir do momento em que se tornou 

“um pequeno rebento que um dia, por fim, rasgou a terra e surgiu no mundo” 

até dos seus frutos cair nova semente e o ciclo recomeçar.


Nesta obra de Eric Carle, também de 2020, editada pela Kalandraka, A pequena Semente, o leitor é convidado a acompanhar a viagem de uma semente, desde o outono, momento em que se desprende da árvore, a conhecer as dificuldades por que passa até se tornar numa grande e exuberante planta, admirada por todos no verão, até à chegada, novamente, do outono, onde tudo passa e tudo recomeça. (Falamos desta obra AQUI).

Pormenor do interior do livro A pequena Semente, anunciando a chegada da primavera.

Podemos ver este mesmo ciclo na obra Começa numa semente, de Lara Knowles e Jennie Webber, de 2018, editada pela Fábula, à qual nos referimos em Dá Guarda(s) à Terra, no dia da Terra de 2020. 

Para além da delicadeza das ilustrações, de que é exemplo a imagem abaixo, apreciamos particularmente a página final, que se desdobra em quatro, apresentando de um lado a grandeza de algo que havia começado apenas numa semente, e, de outro, uma espécie de enciclopédia da árvore que o leitor acompanhou, com informação de caráter científico (estas páginas podem ser vistas AQUI).


Pormenor do interior do livro Começa numa Semente, correspondente à primavera.

Também da Planeta Tangerina, o livro de Isabel Minhós Martins e Yara Kono, de 2017, Cem sementes que voaram. Nesta obra destacamos a paciência e a sabedoria da árvore que viu partir as suas sementes e que soube ficar à espera, mesmo quando parecia que nenhuma tinha sobrevivido. E, na verdade, das cem sementes que voaram, apenas sobreviveram dez… uma opção que encerra, em nosso entender, uma mensagem profunda que em muito pode contribuir para uma maior compreensão e aceitação das leis do Universo. Também falamos desta obra AQUI.

Num tempo dominado pelo ecrã, pela velocidade, pela fragmentação de informação, e pela incerteza, estas leituras apresentam-se como um convite a abrandar, a refletir e a (re)descobrir a beleza e a grandeza do que nos rodeia. Como referiu Pedro Cerrillo, a boa literatura sempre nos ensina algo importante do mundo e da vida, com a sua capacidade de transformar o quotidiano em extraordinário e o estranho em familiar. E essa impressão de que ao ler aprendemos algo, sem saber muito bem o quê, a que se refere o mesmo autor, talvez seja afinal… a Felicidade.

Feliz dia mundial do Livro e felizes Leituras!

[LMB]

terça-feira, 6 de outubro de 2020

Livros e Ideias para Celebrar o Outono

Celebrar o outono pode ser um caminho de descoberta da beleza, um caminho de gratidão à Natureza, e uma oportunidade para refletir sobre o lugar de cada um de nós nesta Casa comum.

Representações do outono na Literatura para a Infância (e não só).

Tornou-se habitual a expressão "agora já não há quatro estações" (o que não deixa conter alguma verdade, sobretudo devido às alterações climáticas). 
No entanto, ainda é possível encontrar características específicas de cada uma das quatro estações, e parece-nos que também será possível, de algum modo, reverter esta situação (recordemos os meses de confinamento, quando o mundo parou e a natureza se revelou – imagens de cidades sem fumo, de espécies animais que regressaram, etc, inundaram os noticiários e as redes socias). 

Há um conjunto considerável de obras que têm por base a temática das estações do ano. Falamos de algumas, a propósito das representações do verão na LIJ, AQUI. Na imagem, podemos ver representações do outono em A Árvore, de Iela Mari, O outono é o tempo a envelhecer, de Mª Isabel César Anjo e Mª Keil, um livrinho que integra Estações do Ano, de que falamos AQUI, e Começa numa Semente, de Webber Knowles, obra a que já nos referimos a propósito das comemorações do dia da Terra, AQUI.

As representações do ambiente na literatura para a infância apontam, hoje, para uma visão mais ecocêntrica do mundo, em detrimento da visão antropocêntrica, que durante muito tempo prevaleceu. Estas obras podem ser um caminho para aguçar o olhar para o Belo, para a riqueza e diversidade da Natureza.

Representação do outono, num belíssimo pop-up (em inglês) que faz o pequeno leitor participar das descobertas que se revelam a cada nova estação. Seasons, de Anna Milbourn e Alexandra Badiu.

Trazemos, neste sentido, um conjunto de sugestões literárias (e não só) para celebrar o outono. Obras que nos convidam a (re)descobrir a essência, a abrandar, a aprender que tudo tem o seu ritmo e o seu tempo.

Pormenores das obras Seasons, de Anna Milbourn e Alexandra Badiu e As quatro Estações de António José Abad Varela e Emílio Urberuaga.

Conhecer para amar. Conhecer a Terra, o Planeta, a Natureza, o Universo e as suas leis, para o aprendermos a amar e a respeitar.  Neste campo, obras que versem sobre os ritmos e os ciclos da natureza, por exemplo, podem desempenhar um importante papel. 

A incontornável Floresta de Sophia e o emblemático passeio pelas quatro estações, pela mão de Isabel, a protagonista desta belíssima narrativa.

Enquanto parte do mesmo cosmos, nós também somos seres de ciclos e de ritmos. Ritmos esses que deixamos de respeitar, e o resultado está à vista! Portanto, regressar às origens, através da literatura, constitui um possível (e poderoso) meio de reflexão sobre o nosso lugar nesta Casa que é de Todos.


Pormenor da primeira página de A Pequena Semente, de Eric Carle, uma narrativa que começa e acaba no outono, reforçando a ciclicidade da natureza. Falamos desta obra AQUI.

O outono, que "é tempo em que o sol parece morno" (Anjo, Mª. I. e Keil, Mª. in O outono é o tempo a envelhecer), convida a passeios pelo campo, pelo monte, pela floresta. Sair para passear e recolher alguns elementos característicos desta estação, para além de proporcionar a experiência real do contacto com a natureza e a sua exuberância cromática nesta época do ano, pode resultar em atividades bem divertidas, e ao mesmo tempo, formativas. Podemos, por exemplo, construir um alfabeto de outono, inspirando-nos nas ideias que a Marie Claire apresenta, AQUI, e depois brincar com as letras, elaborando um Alfabeto Literário, inspirado nesta estação do ano (Falamos de Abecedários Literários AQUI).


Capa e pormenor de duas páginas dedicadas ao outono, em Um Ano Inteiro, Agenda para explorar a Natureza

Os passeios pelo exterior podem ainda ser enriquecidos com as sugestões apresentadas em Um Ano Inteiro (imagem acima), um livro que faz recordar os antigos almanaques, e que é um manancial de ideias para pôr em prática. Há propostas para todas as semanas do ano. Em outubro, por exemplo, os autores recomendam: 
    Semana 1: Escuta a brama dos veados: é agora!
    Semana 2: Faz uma Arca do Tesouro com Sementes (gostamos particularmente desta ideia:)
    Semana 3: Sai à procura de flores outonais
    Semana 4: Faz as aves voar no teu caderno

Pormenores das páginas dedicadas ao início do outono, em O Grande Livro das Tradições Populares Portuguesas, de José Viale Moutinho.


O outono, pelo recolhimento que começa a pedir, é também o momento ideal para resgatar tradições, recolher lendas, provérbios e histórias (dos livros ou da vida). O Grande Livro da Tradições Populares Portuguesas, de José Viale Moutinho (imagem acima) é um excelente livro para toda a família, com um texto para cada dia do ano, ao longo das quatro estações, dos doze meses do ano. 

Excerto do conto "Quando o outono não apareceu", in Brincar às escondidas com a Mãe Natureza, de Rosário Alçada Araújo e Catarina França.

A beleza desta estação é também uma fonte de inspiração para criar pequenas histórias. Agarrando a ideia que o título do texto da imagem sugere ("Quando o outono não apareceu"), vamos criar! O que poderia impedir o outono de aparecer? O que lhe teria acontecido? Por onde andaria?


"O outono entra sempre pela janela", um dos poemas dedicados ao outono em Poemas para as quatro estações, de Manuela Leitão e Catarina Correia Marques, obra de que falamos AQUI, a propósito da primavera.

E para completar este puzzle de ideias para celebrar o outono (com livros), só falta mesmo trazer a poesia. Voltamos a sugerir os Poemas para as quatro estações, obra de que já falamos na Primavera, com a sugestão Andorinhas mensageiras de esperança, e no verão, a propósito das representações do verão na LIJ. Para celebrar o outono, as autoras trazem-nos "O outono entra sempre pela janela" (imagem acima), "Menu serrano" (imagem abaixo), "A lenda de 11 de novembro", "A invasão" e "Árvores caducas".

Excerto de "Menu Serrano" in Poemas para as quatro estações.


Para trazer poesia para o nosso "caderno de criações de outono", sugerimos "escrever ao jeito de...", a partir do poema "Menu Serrano". É simples:
É só pegar no modelo e estrutura das estrofes (imagem acima) e substituir os nomes das serras (que podem ser terras), das pessoas, das ações e dos petiscos.
    Por exemplo:

    Fui à quinta de pentieiros
    Levei comigo o Tomé
    Comemos broas de mel
    E bebemos água-pé


Representações do outono nos livros
  
Em O Amanhã não está à venda, um texto do brasileiro Ailton Krenak, publicado durante o confinamento, o autor refere:

“A nossa mãe, a Terra, nos dá de graça o oxigénio, nos põe para dormir, nos desperta de manhã (…). Tomara que não voltemos à normalidade, pois se voltarmos é sinal que não valeu de nada a morte de milhares de pessoas no mundo inteiro (…) e aí teremos provado que a humanidade é uma mentira”.

Desejamos a todos belos passeios pelos caminhos do outono, e belas criações inspiradas nos livros! E desejamos, sobretudo, que este tempo seja um tempo de contemplação e deslumbramento que nos conduza à reflexão, sobretudo neste momento delicado que vivemos, que nos faz questionar a “normalidade”.

P.S. Podem continuar a fazer-nos chegar os vossos trabalhos, as vossas experiências, as vossas criações de outono. Usem, para o efeito, o formulário de contacto aqui do blogue ou enviem através da nossa página de FB.


sábado, 6 de junho de 2020

Representações do Ambiente na Literatura para a Infância | Novidades 2020

Comemoramos ontem mais um Dia Mundial do Ambiente, uma efeméride que deverá servir sobretudo para refletirmos e repensarmos comportamentos e condutas. Não há (mesmo) Planeta B.

Abundam na Literatura para a Infância, principalmente depois do prémio ambiente na literatura (1975), publicações que versam sobre a temática ambiental. Ora privilegiando uma via mais contemplativa, ora ingressando em terreno mais proativo, as questões da ecoliteracia assumem várias formas na literatura de potencial receção leitora infantil.



Escolhemos para hoje quatro obras novíssimas, editadas em Portugal em 2020, que possibilitam interessantes reflexões e proveitosos caminhos de leitura: um feliz encontro entre o prazer de ler e o de habitar uma Casa tão generosa.

O Bando, a história de uma guardiã de árvores, uma criação de autoria única, de Gemma Koomen, editado pela Fábula, é um trabalho belíssimo que nos remete para o universo dos pequenos seres que habitam os "mundos elementares" (1). Começa assim:

"Na orla da floresta existe uma grande árvore. Se espreitares por entre os seus ramos talvez consigas ver algumas pessoas pequeninas, da altura do teu polegar e com a cabeça do tamanho de uma avelã. São os Guardiões das Árvores."

Dupla página do miolo de O Bando
Neste álbum, somos convidados a acompanhar a viagem de uma pequena guardiã, a Sílvia, e a travar amizade com Tufo, o passarinho bebé "barulhento, desarrumado, e que está sempre esfomeado" com quem Sílvia irá ver o mundo, aprender a dizer adeus e descobrir a alegria da amizade.

Contracapa de O Bando

Do inconfundível Eric Carle, chega a Portugal, editada pela Kalandraka, A Pequena Semente, uma obra que retoma o tema dos ciclos da natureza, materializado nas estações do ano que servem de cenário à narrativa, e que trazem ao de cima questões como a resiliência, o saber esperar, o "invisível aos olhos". 


Uma obra que encontra eco em trabalhos como Cem sementes que voaram  e Começa numa semente, de que falamos AQUI, em Ainda Nada, de Christian Voltz, e também, de certo modo, em A maior Flor do Mundo, de José Saramago. O acompanhamento da vida da pequena semente, que o leitor é convidado a fazer, culmina no "eterno retorno" tão presente nestas questões:

"O vento sopra mais forte. A flor perdeu quase todas as suas pétalas. Ela agita-se e desvia-se do vento, mas ele sopra cada vez mais forte e abana a flor. O vento torna a abanar a flor e, desta vez, o seu ovário abre-se. Lá de dentro saem muitas pequenas sementes que rapidamente esvoaçam pelos ares, levadas pelo vento."

Pela Orfeu Negro, chega A Abelha, de Kirsten Hall e Isabelle Arsenault, um livro cor de mel, perfumado com o aroma de flores do campo. Um livro para ler como quem dança, acompanhando os "passos" da sábia e laboriosa orquestra apícola.  

"Começa a dança.
Remexe,
balança.
Que grande pagode!
Estremece,
sacode.

Agora o comboio, em fila indiana,
depois faz um oito, abana e abana.
(...)"

Dupla página do miolo de A Abelha
Este álbum, além de uma delícia para os olhos, é uma excelente forma de aproximação a questões tão importantes como a preservação das espécies. Em jeito de "compêndio", o livro integra uma página informativa, dirigida ao leitor, com curiosidades sobre as abelhas e ainda com um conjunto de sugestões sobre "Como ajudar as abelhas".

"Compêndio Informativo" que integra a obra A Abelha
E, por último, nascido em Portugal, A menina que queria desenhar o mundo, um livro de Adélia Carvalho e Sérgio Condeço, editado pela Nuvem de Letras. Imersa numa visão de interdependência (uma visão ecológica, na verdadeira aceção do termo), esta obra convida a aguçar o olhar sobre o que nos rodeia, do mais próximo ao mais longínquo, desde a "árvore que só crescia se não estivessem a olhar para ela", passando pelos "dias que parecem noites e pelas noites que parecem dias", até "aos amigos que moram em países distantes", a menina que queria desenhar o mundo guia o (pequeno) leitor numa viagem de auto e hetero descoberta, que culmina na palavra mágica "Nós".

Dupla página do miolo de A menina que queria desenhar o mundo

A Literatura em geral, e a Literatura para a Infância em particular, é um espaço de reflexão, que, não mudando o mundo, opera mudanças nas pessoas que o podem mudar! Cuidar desta Casa tão generosa é tarefa de Todos e de cada Um (os livros dão uma ajuda). 

(1) Esta expressão é retirada do subtítulo da obra de Cristina Carvalho (2011) Lusco-fusco, Breviário dos Mundos Elementares.



quarta-feira, 22 de abril de 2020

Dá guarda(s) à Terra #Fique em Casa 12

Para comemorar o Dia Mundial da Terra, escolhemos dois livros unidos pelas sementes, Começa numa Semente, uma obra de Lara Knowles e Jennie Webber, editado em Portugal pela Fábula, e Cem sementes que voaram, um trabalho nacional, de Isabel Minhós Martins e Yara Kono, editado pelo Planeta Tangerina.

Livros para homenagear a Terra

Na obra Começa numa semente (algumas páginas disponíveis AQUI) podemos acompanhar a vida de uma semente, desde a sua chegada à Terra até à transformação numa imponente árvore que é também "um mundo maravilhoso", como podemos ver na imagem abaixo. 

Dupla página do miolo da obra


O texto poético, acompanhado pela sobriedade das ilustrações em tonalidades Terra, transforma-se numa viagem pelas estações do ano e pelo caráter cíclico da Natureza, culminando no natural curso das "coisas da Terra":



"Mal as sementes estão prontas,
partem no sopro da brisa
e talvez algumas delas
venham  a ser um dia
árvores cheias de vida."


Quádrupla página final


Este belíssimo livro, para além das sementes, partilha com o álbum Cem sementes que voaram, páginas finais informativas, uma tendência crescente na edição literária para a infância e juventude.


Páginas finais: o texto que preenche o livro (aqui condensado)
e informação científica sobre a árvore desta história e seus elementos. 

O álbum do Planeta Tangerina podia ser uma continuação desta história... pois conta as aventuras de uma árvore que estava à espera... 
(algumas páginas disponíveis AQUI)


Dupla página inicial de Cem sementes que voaram
Das suas cem sementes que voaram... aparentemente, todas foram desaparecendo: na estrada, no mar, nas pedras, no bico dos pássaros, na barriga de um esquilo... tendo restado apenas uma, que depois de germinar serviu de lanhe a um coelhinho. Mas será que foi mesmo assim?
Ao que parece, a espera valeu a pena, pois 

"A árvore já sabia:
muitas vezes,
para tudo correr bem,
basta saber esperar."

E o livro termina com umas belíssimas guardas finais que são uma espécie de enciclopédia poética das sementes.


Guardas Finais

Estes livros são um convite a deter o olhar sobre as pequenas coisas, e a refletir sobre a grandeza dos mistérios que a Terra encerra.


Contracapa de Cem sementes que voaram

São também uma oportunidade para aprender a tirar partido de aspetos do livro que muitas vezes nos passam despercebidos: a capa, a contracapa, e sobretudo as guardas. Estes elementos paratextuais são excelentes meios para aguçar a curiosidade dos pequenos leitores, e, no caso destas obras, para enriquecer o seu conhecimento enciclopédico.

Recuperamos, a este propósito, as dicas de leitura que partilhamos no âmbito das comemorações do dia internacional do livro infantil:




A nossa sugestão de atividade, a realizar em família, é uma oficina de Capas, Contracapas e Guardas. Sugerimos:


- escrever palavras soltas ou pequenos textos, dedicados à Terra (pode ser uma quadra, um poema, uma carta de agradecimento, um recado, um abecedário ilustrado...)


- desenhar / pintar os nossos locais verdes preferidos (uma árvore, um recanto do jardim, um parque, uma memória de um piquenique ou de um passeio...)

- fotografar "bocadinhos de verde" (um cantinho do jardim, um pássaro, uma árvore em flor, o brotar das folhas...)


Guardas iniciais de Cem sementes que voaram

- Com esses elmentos (e/ou com outros que entendam por bem utilizar) vamos construir capas, contrapas e guardas para Livros / Álbuns Verdes. Podemos inspirar-nos nas capas, contracapas e guardas destas obras. 

- Depois de prontas, podemos lá colocar (sempre que tivermos vontade ou encontrarmos por acaso) textos / desenhos / fotografias / artigos de jornal ou revista... dedicados à Mãe Terra (no fim teremos construído um belo portefólio que é também um hino à Natureza).

Contracapa de Começa numa Semente
A literatura é sempre um auxílio precioso à abordagem das grandes questões. Vamos homenagear a Terra com a ajuda dos livros!

Partilhem connosco as vossas experiências e façam-nos chegar os vossos trabalhos. Vamos engrossar o caudal de gratidão à Terra.



Fiquem em casa e (re)descubram o prazer de ler juntos!




quinta-feira, 2 de abril de 2020

#Fique em Casa 10 Especial Dia Internacional do Livro Infantil

Hoje comemoramos mais um dia Internacional do Livro Infantil, uma efeméride que é uma homenagem àquele que é considerado o pai da Literatura Infantil, Hans Christian Andersen, nascido a 2 de abril de 1805, na cidade de Odense, na Dinamarca.
Girando os assuntos que nos ocupam neste espaço em torno da Leitura, da Literatura e da Educação Literária na Família, hoje, neste especial #Fique em Casa, vou falar-vos das escolhas dos meus filhos (que têm hoje 20 e 15 anos).

A escolha do mais velho e um "caracol literário"

Questionados sobre que leitura(s) recordavam, de modo particular, da sua infância, obtive respostas curiosas. Enquanto o mais velho, sem grande hesitação, respondeu: Contos da Mata dos Medos de Álvaro Magalhães e Cristina Valadas, o mais novo recordou-se de O Gato Comilão, um conto popular dinamarquês, recontado por Patacrúa e Oliveiro Dumas.

A escolha do mais novo, aprovada pela Luísa.

Contos da mata dos medos foi (é) uma obra marcante na família. O primeiro volume desta tetralogia foi publicado em 2003. Terá sido aí por 2005 que chegou cá a casa, tendo-se tornado companheiro de leitura diária em família. As personagens que se reuniam na "clareira do pinheiro grande", o Chapim, a Toupeira, o Coelho, o Caracol, e a "Pequenita" (a lagarta peluda) passaram, de certo modo, a fazer parte da família, até aos dias de hoje. Não raro, alguém anda a "ouriçar" (como o ouriço), a descobrir coisas "muito úteis" (como a toupeira), "atarefado e apressado" (como o chapim), com medo de algo (como o coelho), ou em modo caracol, que está sempre a partir para ver o mar.


Os Contos da Mata dos Medos
já deram tema a várias festas de família.
Na imagem,
um caracol literário encontrado numa "Caça aos Caracóis"

Ao primeiro volume seguiram-se mais três:  A Criatura Medonha – Novos Contos da Mata dos Medos (2007); Um Problema Muito Enorme – Novíssimos Contos da Mata dos Medos (2008); e O Lugar Desconhecido – Últimos Contos da Mata dos Medos (2010). Ao longo de cerca de meia década, estas obras foram responsáveis por momentos de verdadeiro prazer, cá em casa.
A par dos aspetos que singularizam a obra de Álvaro Magalhães, que consegue abordar questões tão profundas como o amor e a morte, com uma generosa dose de humor, esta tetralogia levanta questões de ordem ecológica que passam não apenas pelas ameaças do homem, como o fogo, a caça, ou a poluição, mas também pelos próprios fenómenos naturais, como as inundações ou as tempestades.

Ilustração inicial: os habitantes da clareira do pinheiro grande.

É muito fácil, de facto, criar o gosto pela leitura junto de crianças de tenra idade. Se aos bons livros (e hoje há livros muito bons!) juntarmos um pouco de tempo e entrega (total), diariamente, os momentos de leitura entre pais e filhos convertem-se, efetivamente, em memórias positivas duradouras. 
Apesar de o meu filho mais velho ter aprendido a ler durante o período em que esta coleção passou por nós, estas obras foram, sempre, lidas em voz alta, por mim ou pelo pai. Era um momento aguardado por todos.

A sugestividade dos capítulos do primeiro volume
ou a força das palavras de Álvaro Magalhães

Gostava, pois, de deixar um apelo aos pais que têm agora crianças pequenas: Não deixem de ler aos vossos filhos, pelo facto de eles já terem aprendido a ler. Na verdade, na maioria das vezes, apenas aprenderam a decifrar, e continuam a precisar de quem os guie e acompanhe na descoberta do prazer de ler.


Pormenor do miolo: o ouriço, a toupeira e o caracol.


Esta coleção foi, entretanto, "compilada" num único volume que tem por título A Mata dos Medos (2015), uma obra com ilustrações de Sebastião Peixoto, da qual podemos ler alguma páginas AQUI.

Capa da obra que reúne todos
 os Contos da Mata dos Medos

Sobre a escolha do mais novo...


Dupla página inicial de O Gato Comilão

A escolha do mais novo, O Gato Comilão, encontra-se, sem dúvida, associada ao lado lúdico e à vertente jogo que as narrativas de estrutura acumulativa proporcionam. Trata-se de uma divertida história de um gato que come tudo o que lhe aparece: a velha com quem vive, a panela das papas, e todos aqueles que lhe perguntam: "- Ó gato, porque estás tão gordo?", e a quem vai respondendo  "- Porque comi...".


Dupla página do miolo:
o gato comilão já comeu as papas, a panela, a velha, o anão,
o homem do burro, os cinco pássaros, e prepara-se para comer mais alguém...

É claro que alguém terá de pôr termo à gula do gato...


Dupla página do miolo:
 "o lenhador empunhou o machado que levava às costas e..."

O final inesperado desta narrativa, que coincide com o regresso do gato no momento em que a velha se prepara para comer (finalmente) as papas, ao mesmo tempo que acentua o lado nonsensical que permeia a obra, reforça a sua componente lúdica com um convite para "voltar a jogar". É que... um gato tem sete vidas!


Momento lúdico em torno de O Gato Comilão:
o livro transformou-se num jogo (criado pela educadora de infância)
 e circulou pelas casas das crianças (2006/2007).

(Podem ver AQUI uma recriação que os Triquiteiros de S. João fizeram desta obra)

Que a passagem deste Dia Internacional do Livro Infantil, que este ano se comemora em condições excecionais, em casa, constitua uma oportunidade de reflexão sobre a importância de tornarmos os livros uma presença assídua nos nossos lares, e de fazermos da Leitura um verdadeiro Valor de Família.

Como referiu Pedro Cerrillo (2014), “A literatura, na qualidade de depositária de conhecimentos que deveriam ser obrigatórios numa sociedade de pessoas livres, críticas e interventivas, não pode ser considerada um luxo cultural dispensável”.*

Memórias felizes da família

Hoje é dia de criarmos memórias felizes em torno dos livros e da leitura!

#Fiquem em casa e (re)descubram o prazer de ler juntos.


*Cerrillo, P. (2014). “El Poder de la Literatura”. Lección Magistral impartida por Pedro C. Cerrillo en el acto de inauguración del curso académico de la Universidad Española, presidido por SS.MM. los Reys de España. Toledo: Ediciones de la Universidad de Castilla-La Mancha.